quarta-feira, 13 de junho de 2012

Frankenstein religioso



Parece contraditório, mas é verdadeiro. Existe um sentimento altivo, quase que automático naqueles que estão agregados de forma institucionalizada no contexto espírito religioso. Embora a religião tenha fundamentalmente o princípio da humildade, ela torna o homem levemente arrogante e separatista. Leva-o a ter sobre si, algumas ideias demasiadamente exageradas.

Ela surgiu na antiguidade com princípios de igualdade, serviço, e misericórdia. Entretanto, o homem nunca se mostrou muito bom na hora de lidar com a espiritualidade de uma forma institucionalizada, dogmática, regrada. Na tentativa de domesticar o Espírito de Deus, o homem se tornou escravo de sua própria invenção. No desejo de possuir Deus, o encaixotamos em lendas, pessoas, histórias e lugares. A religião é o nosso Frankstein. Nós a criamos e demos vida, mas nunca a compreendemos, nem a dominamos totalmente.

Elas se diversificaram de acordo com as culturas e povos. Atualmente existe uma centena de milhares de caminhos, ritos e fórmulas religiosas. Esses emaranhados divinos espalhados nos presentes credos, mais embaralham os sentidos do que propriamente os aguçam. Se a religião nasceu com o propósito de apontar um caminho, facilitando nossos entendimentos, acho que ela não cumpriu com seu propósito. Deveria desfazer os nós, mas no mundo não houve instituição mais burocrática e inflexível. Ela foi a mais misteriosa de todas as ideias humanas. Nasceu fundamentalmente para apontar uma direção até Deus, mas terminou apontando para o próprio umbigo.

Por isso, os religiosos inflam seus egos e vaidades fazendo discursos sobre humildade. Eles não são o meio para que o mundo conheça Deus, o amor e a misericórdia, mas o fim, a consequência, a evolução, a linha de chegada. Possuem explicações mais sábias, ideias mais elevadas, percepções mais aguçadas. Estão no pedestal do conhecimento e da sabedoria espiritual, enquanto, nós, ainda no mundo  “infra-hominal”, caminhamos na tristeza de nossas mais tenras ignorâncias. Os evoluídos espíritos da religião caminham de cabeça erguida por um lado, enquanto que, nós, os intocáveis, rastejam do outro. Destes darwinismos, no qual alguns são larvas e outros são mestres, o mundo celebra mais um latifúndio. Alguns poucos detentores da “divina” evolução humana espiritual e outra centena de intocáveis ignorantes, como eu, que vivem os débitos de maldades acumuladas do ano de 1298.

As ideias e percepções espirituais dos intocáveis, dos não religiosos, são como larvas a serem desprezadas. Elas surgem de mentes que poluem os planos mais elevados, mas minha insana racionalidade pensa que, quanto mais se aproxima o homem do Criador, mais criatura se transforma. Quanto mais acesso ao conhecimento, menos sábio se torna. Quando maiores forem suas ideias, menor seus conceitos próprios.

A percepção que leva a conhecer profundamente um credo religioso é o orgulho e a vaidade presente nas pessoas que professam determinada fé. Qualquer conceito que coloque um homem acima do outro é fútil o suficiente para ser desprezado. Qualquer ideia religiosa que permite um pensamento demasiadamente sábio em relação a si mesmo é humano demoníaco. Existem realmente pessoas melhores do que outras. Entretanto, esta é uma questão de educação e de escolhas próprias, fruto muito mais do amor que raciocina, enxerga, e se entrega, do que de um espirito evoluído que doa com a mão direita da caridade, mas espera o retorno com a esquerda da ambição capitalista.

Não imagino Deus criando este cenário de diferenças entre os evoluídos e os miseráveis. Este deus que capacita o homem a se perceber maior e mais evoluído do que o outro é humano e interesseiro. Estes latifúndios sempre geraram discriminações. Foram terminantemente a principal causa das nossas dores humanas, conjugais, profissionais.

Se Deus existe, jamais serei melhor do que ninguém, nem mais evoluído, apenas um eterno aprendiz do amor divino, porque tudo se resume nele, o resto é puro dogmatismo religioso que enfeita a mente, mas nada realiza no coração. O mais profundo entendimento espiritual é aquele que realiza o melhor para o outro, compreendendo que esta realidade jamais o coloca acima dele. É o entendimento que faz do bem ao próximo, não um meio ou um ritual de prosperidade futura, mas um fim, porque o homem nasceu para as boas obras. Até porque a prosperidade não é atraída por ondas eletromagnéticas ou espirituais, mas pelo trabalho inteligente, por ideias inovadoras, por decisões importantes, pela dedicação diária. Qualquer coisa que se realiza no mundo espiritual com intenções individuais, por melhores que sejam, são totalmente descartáveis.  

Os religiosos e místicos do século XXI se sentem num plano espiritual mais elevado, mais belo, entretanto, estão na mais profunda miséria existencial. Estão enegrecidos pelo desejo do "EU" quando na verdade, Deus se revela no "NÓS". Tudo aquilo que se realiza para o outro, sem os ambiciosos desejos egoístas, é a mais profunda e eterna religião humana. Quando o assunto é Deus, a intenção é mais importante do que a realização. Os religiosos nunca se importaram com isso.
O místico mundo das invisibilidades ou das energias é pequeno perto da concretude do amor, da benevolência, da graça e do perdão. Todos os mais nobres sentimentos não acontecem entre homem e instituição, mas entre almas e corações.


terça-feira, 5 de junho de 2012

O casamento em guerra


Este momento urbano cheio de negócios e interesses contemporâneos não estancou nossa mais básica necessidade. Queremos uma noite tranquila de sono e um amor para debruçar nossos sentimentos. Numa dessas conversar informais, um amigo dizia que a causa da separação de seu amor tinha muito a ver com o fim da paz. O casamento havia se transformado numa guerra.

As relações estão nessa variável que vivencia algumas guerras. O amor não é capaz de impedir as diferenças e até mesmo as discussões, mas é suficientemente grande para soluciona-las. A maior parte dos conflitos é uma consequência ardente e direta do desejo de conquistar o território do outro. As maiores guerras mundiais surgiram na cabeça de alguns líderes que desejaram dominar o mundo. Talvez isto seja abstrato, mas a vaidade a concretiza. Ao amor existem muitos concorrentes. O orgulho, o pior deles, estabelece estes conflitos diários que tornam concreto nossas idiotices não reveladas. A ansiedade de domínio absoluto é o que leva os amantes para dentro do ringue. Geralmente as pessoas lutam tanto por um amor, que o imobilizam como se os sentimentos estivessem em cima de tatames. Ninguém que vive esta realidade é feliz. Sente-se alegre somente quando soa o gongo dos intervalos.  Melhor é o alivio da distância do que as fagulhas do aconchego. O silêncio e a tranquilidade dos casamentos modernos, em sua grande maioria, não significam o fim da guerra. São apenas raros momentos de trégua.  

Para quem deseja ardentemente dormir um sono leve sem medo de ser atingido por um tiro amigo, precisa levantar a bandeira branca. O amor não domina, mas se entrega voluntariamente. O amor não toma os espaços e territórios do outro, mas é invadido totalmente por quem se ama. Ele decreta paz, porque não se importa por vitórias. Jesus, quando decidiu enviar sua maior mensagem de amor, se entregou totalmente. Seus braços abertos na cruz, revelou seu mais profundo sentimento. Ele abriu mão da influência popular suficiente que tinha para realizar um grande motim. Morrendo naquela cruz parecia o mais vil dos derrotados, mas na verdade foi o mais heróico dos vencedores. A paz é fruto deste amor que perde, mas que na verdade vence. O verdadeiro amor está sempre de braços abertos, nunca de punhos em riste.  

Quando a vida se torna em uma guerra, tudo fica desconfortável. Quem vive nas trincheiras, troca a cama quentinha pelo sofá duro. No desejo bruto e irrefletido de alcançar paz, a solução vai para os tribunais. Crianças e revólveres para um lado, talheres e munições para o outro. Eis a melhor forma de não haver vencedor, nem perdedor. Para quem não sabe perder, melhor empatar. Para quem não consegue a harmonia, resta despedidas.

O amor? Seu maior legado é a paz. Seu maior fruto é o sono acalentado pelas boas lembranças. Quem ama não precisa de mais nada para ser feliz, pois o amor proporciona gratuitamente, o que o mundo tenta desesperadamente comprar com dinheiro.