sexta-feira, 11 de maio de 2012

Babaca


A distância de Pelotas até Curitiba é 950 quilômetros. É uma viagem desgastante ainda mais quando se tem um carro lotado de malas, roupas e as bugigangas das mais variadas. Entretanto a tranquilidade de qualquer viagem longa termina quando os carros ficam enfileirados no marasmo constante de um grande congestionamento.
A pior coisa de um congestionamento não é a inércia de ficar parado contemplando uma imensidão de carros na sua frente, mas ver alguns que, sempre os chamo de “babacas”, passarem pelo acostamento. Fico com pensamentos ruins. O congestionamento fica mais estressante em saber que alguém está tirando vantagem. O sentimento de ser passado para trás é horroroso. Nós brasileiros convivemos com estes sentimentos diariamente toda vez que pagamos impostos ou que enfrentamos qualquer imbróglio profissional ou pessoal, que seja. Parece-me que o mundo é como uma empresa funerária. A morte de uns traz lucro para outros. Fiquei olhando o limpador de para-brisa tirar as pequenas gotículas de água enquanto minha raiva sucumbia ao marasmo.
A honestidade é um congestionamento burocrático que necessita de paciência. Aguentar a quietude de permanecer parado, enquanto os outros aceleram no acostamento é um desafio. Falando neste português, pareço ser o mais justo dos motoristas, o que não é verdade.  Meus julgamentos em grande parte são justos, mas impertinentes. Volte e meia, me sento no banco dos réus. Uma semana depois daquele episódio na estrada, fui o babaca que, com pressa, entrei numa contra mão. Deixei uma centena de carros para trás. O semblante da minha esposa disse muitas coisas. Naquele momento me senti o “babaca” do dia. Dependendo da situação aceitamos esse termo como pseudônimo. Parece que a minha pressa e os meus interesses são maiores do que os do mundo inteiro. Naquele momento, pareço não me importar em ser um babaca. Em meu íntimo secretamente escondido uma voz me absolve dizendo: - Valeu a pena!

Desconfio que dependendo da situação e do stress o homem desaba, sendo capaz de abandonar até mesmo sua ética e suas mais profundas convicções. Isso demonstra o caos que vivemos na política, no mundo corporativo, na relações, e nas demais áreas que envolvam pessoas e interesses. A bancarrota congestionada de alguns é a oportunidade de outros. Estou começando acreditar que o desafeto que se nutre pelos políticos corruptos não seja exatamente pela falta de honestidade e transparência que eles possuem, mas porque não desfrutamos das mesmas “cachoeiras” do Planalto Central. Talvez o que sentimento não seja indignação, mas inveja. Se isso realmente for verdade, estamos perdidos.
A vida é melhor quando temos o mesmo proceder na necessidade e na abundância. O stress e os interesses estão sucumbindo os princípios. Visualizar essa nossa mais vil ignorância que ora age de uma maneira, ora de outra, absolve boa parte dos babacas que nos ultrapassam nos acostamentos. Há uma mudança repentina de conceitos em todo momento, basta um motivo vantajoso. Isso está acontecendo no trânsito, na família, nas relações, nos negócios, em um restaurante, num cinema ou dentro de um táxi. Queremos algum acostamentos para acelerar. Quem dera pudéssemos perceber que não somos somente as vítimas, os injustiçados, os trapaceados. Por diversas vezes, por mais esdrúxula ou menor que seja, somos os grandes babacas da história.

Ser feliz está diretamente relacionado com um proceder que não fere aos outros. A uma rotina que não deixa os outros para trás, mas que espera na fila. Um viver que respeita os sentimentos daqueles que estão fazendo a mesma viagem. A alegria não é um rápido sentimento de alivio, mas um permanente estado de espirito. Aqueles que são felizes certamente souberam lidar melhor com as demoras e os congestionamentos que a vida proporciona, simplesmente porque compreenderam que não é a velocidade, mas a direção que proporciona os momentos e lugares perfeitos.

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