Nem todos gostam de viajar de avião. Muito embora existam menos acidentes aéreos do que terrestres, ainda nos sentimos mais seguros com as mãos ao volante de numa estrada extremamente movimentada, do que sobrevoando os mais livres céus da Califórnia.
A segurança é um apelo moderno.
Nosso desejo é trancar portas e janelas, colocar cercas e alarmes. É estar com
os pés no chão, sem riscos, sustos, nem surpresas. O amor, no entanto, é o mais
aventureiro dos sentimentos humanos. Ele não sobrevive com medos, e por isso,
deixa portões abertos, destranca janelas, desliga alarmes. O amor nos livra dos infernos
terrestres, porque sobrevoa tudo com um olhar mais longínquo. Aparentemente os
perigos de quem ama são maiores, no entanto, acontecem mais acidentes com quem
está nas estradas da solidão, do que com aqueles que se encontram nas nuvens do
amor.
O fim dos laços de quem se ama é o
mais catastrófico acidente deste mundo. Tudo que ocorre na terra não é tão extraordinário,
do que aquilo que acontece nos céus. Nada sobrevive a um acidente como esse. O amor que multiplica, soma e agrega sentimentos
e alegrias, é também aquele que, divide, subtrai e diminui nossas ignorâncias e
vaidades.
A vida não é segura. É um risco
permanente de perdas e lágrimas, de alegrias e sorrisos. O amor é um sobrevoo
perigoso, em que, entregamos nossa alma a quem deseja entregar-se totalmente a
nós. É uma viagem de vida ou morte. Não possui meios termos, meias verdades,
meias passagens. Ou se voa por completo, ou melhor é ficar
com os pés no chão. Ele é o espírito, alma, respiração. Sem ele, a vida é
uma viagem sem adrenalina, talvez até cansativa. Seríamos robôs se reproduzindo
em larga escala. Viajantes, jamais turistas. Sorridentes, nunca felizes.
Estou nas alturas, mas alguém está
comigo neste céu. Esta convicção é a melhor segurança que tenho. Não são os
cadeados que me trazem paz, mas a destreza de sobrevoar liberto as dificuldades. Deus está
em algum lugar neste céu e esta presença conforta, sustenta. O amor é a fórmula
mais profunda e a mais incrível contradição. Ele é uma ferida que dói e não se
sente é um contentamento descontente. É um grande risco seguro. É o mais
profundo lenitivo para todas as coisas desta vida, simplesmente porque não há
como negar. Do alto de um avião tudo ficar menor, mais insignificante, menos
poderoso.
Estar lá em cima é mais nobre oportunidade para enxergar a vida, as
circunstâncias, as pessoas, o mundo de um ângulo mais privilegiado. O medo que nos impede de voar é o mesmo que não nos permite enxergar algumas coisas. A maior segurança que temos é na verdade não nos sentirmos seguros. Esta insegurança nos proporciona ter força para voar mais alto. Não que as dificuldades e intempéries terrenos
sejam desprezíveis, mas são muito pequenos, para quem olha a vida da janela de um avião.